A resistência na terapia: por que algo em nós luta contra a própria cura?
Você decidiu começar. Marcou a primeira consulta, sentou-se diante de um profissional e sentiu uma ponta de esperança. As primeiras sessões podem até ser um alívio. Mas, de repente, algo muda. Uma irritação sutil, um tédio inexplicável ou uma vontade avassaladora de cancelar a próxima consulta. Esses sentimentos são exemplos clássicos de resistência na terapia.
Se você se identifica, respire fundo. Você não está sozinho. Está vivenciando um dos fenômenos mais comuns e importantes do processo terapêutico: a resistência na terapia. Longe de ser um sinal de fracasso, essa força contrária é, muitas vezes, a prova de que o trabalho está chegando onde precisa.
Como disse a terapeuta Lori Gottlieb: “A natureza da vida é a mudança, e a natureza das pessoas é resistir às mudanças”. Este artigo é um mapa para entender esse mecanismo e, principalmente, não desistir de si mesmo quando ele aparecer.
A visão de Wilhelm Reich sobre nossas defesas
Muito antes de a terapia se popularizar, o psicanalista Wilhelm Reich dedicou a primeira parte de sua obra-prima, “Análise do Caráter”, a um único tema: as defesas do paciente. Ele foi pioneiro ao perceber que o maior obstáculo no processo não era a falta de memórias, mas como uma pessoa ativamente (e inconscientemente) se protege da própria análise.
Essa proteção não é somente uma recusa verbal. Ela se manifesta de formas sofisticadas:
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O “Bom Paciente”: A pessoa extremamente gentil, que concorda com tudo, mas nunca se aprofunda. A gentileza se torna um escudo que impede qualquer confronto real com a dor.
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O Paciente Evasivo: Aquele que preenche o tempo da sessão com trivialidades — o tempo, a política, o problema do vizinho — para evitar o silêncio e o mergulho interno.
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O Paciente Duro ou Cético: A pessoa que desafia cada palavra, intelectualiza cada sentimento e se recusa a fazer os exercícios propostos. A dureza é uma armadura para proteger um interior extremamente frágil.
Cada um desses perfis ilustra formas diferentes de resistência na terapia. Reich nos ensinou que essas atitudes não são falhas, mas defesas construídas ao longo de uma vida para sobreviver — o que ele chamou de couraça.
A resistência na terapia é a recusa do ego
A resistência na terapia é, muitas vezes, a recusa do ego em abandonar velhos padrões. A experiência terapêutica vai, inevitavelmente, cutucar formas de pensar e de agir que seu ego não vai querer jogar na fogueira do sacrifício.
Seu ego, o gestor da sua identidade, prefere a dor que já conhece ao desconforto da mudança. Abandonar um padrão de autossabotagem, por exemplo, significa encarar a responsabilidade de ser feliz, e isso pode ser assustador.
É por isso que, quando a terapia começa a funcionar de verdade, o impulso de fugir grita mais alto.

A desculpa perfeita: “Preciso parar, o orçamento apertou”
Uma das justificativas mais comuns e socialmente aceitáveis é a financeira. É impressionante a frequência com que essa “realidade” surge exatamente quando o processo terapêutico toca em um nervo exposto.
Embora dificuldades financeiras sejam reais, muitas vezes a mente encontra a desculpa perfeita para fugir do campo de batalha. O paradoxo é que, ao perseverar, muitos pacientes desbloqueiam padrões que acabam por melhorar também sua relação com a prosperidade.
Transferência: quando o terapeuta se torna o “problema”
Este é, talvez, o ponto mais crucial do processo. Conforme o vínculo se aprofunda, seu terapeuta deixa de ser somente um profissional que você admira. Inconscientemente, você começa a projetar nele as figuras centrais da sua história.
Na sua mente, ele pode se tornar o pai duro, a mãe ausente, o parceiro que traiu ou o chefe crítico. É natural e esperado que, em algum momento, você sinta raiva, desconfiança ou irritação direcionada a ele. É neste ponto crucial que muitos fogem, justificando com uma súbita “antipatia” pelo profissional.
O que muitas vezes não percebemos é que este é o trabalho terapêutico em sua forma mais pura. Na transferência, seu terapeuta se torna a representação viva da pessoa com quem você precisa resolver suas pendências. A terapia vira um laboratório seguro para você sentir, reagir e se posicionar de uma forma nova e mais saudável.
Essa projeção pode tomar, inclusive, uma forma ainda mais complexa: o interesse erótico ou romântico. Sentir-se atraído pelo terapeuta é uma das manifestações mais poderosas e sofisticadas da resistência na terapia. Ela atua para desviar o foco do trabalho terapêutico, criando duas rotas de fuga para não lidar com a dor original: a tentativa de sedução (que muda a natureza da relação) ou o abandono do processo (por não conseguir sustentar o desconforto).
O que fazer? Leve o desconforto para a sessão
O seu incômodo é o mapa do tesouro. Ele aponta exatamente para onde você precisa olhar. Em vez de cancelar, faça o oposto. Chegue e diga o que você realmente sente:
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“Hoje eu não queria ter vindo.”
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“Estou com raiva de você.”
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“Sinto que não estamos saindo do lugar.”
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“Estou pensando em parar porque precisei fazer uma compra e não tenho dinheiro para as sessões.”
Trazer esses sentimentos “proibidos” para a terapia é o ato mais corajoso que um paciente pode ter. Ao fazer isso, você transforma o obstáculo no próprio caminho. É nesse momento que a cura real e profunda acontece.
A terapia não é para se sentir bem o tempo todo. É para, finalmente, ficar bem consigo mesmo. E isso exige atravessar o desconforto.
Se você resiste em dar o primeiro passo em direção à terapia, este é o momento
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Marcelo Ivanovitch
Terapeuta Reichiano
Atendimentos presenciais no Rio de Janeiro e online para todo o Brasil